Artigos Postado no dia: 15 julho, 2024

Planejamento tributário panorama atual e perspectivas

O planejamento tributário pode ser conceituado como um conjunto de estratégias e ações adotadas por uma empresa para otimizar a gestão dos seus tributos, podendo englobar reestruturações societárias e do próprio negócio. Na esfera administrativa, isso inclui revisões contábeis, que visam identificar eventuais oportunidades previstas em leis e normas aplicáveis, que eventualmente não tenham sido observadas, de modo a obter uma redução de carga tributária.

Entende-se primordialmente que tal possibilidade decorre do princípio Constitucional da Livre Iniciativa (Art. 1º, IV, CF/88). No entanto, a discussão sobre a mesma avança na questão atinente à diferenciação entre Elisão Fiscal x Evasão Fiscal.

Sobre tal diferenciação, a doutrina majoritária entende, em resumo, que Evasão Fiscal é aquela que se volta para a prática de condutas ilícitas, através da utilização dos expedientes de dolo, fraude ou simulação, ou mesmo o abuso de forma (Elusão Fiscal). Já a Elisão Fiscal compreenderia a atuação através de condutas lícitas admitidas e previstas pelo ordenamento jurídico

Está discussão teve sua importância reavivada com o advento da Lei Complementar 104/01 que introduziu o Parágrafo Único ao art. 116 do Código Tributário Nacional, verbis: “Parágrafo único. A autoridade administrativa poderá desconsiderar atos ou negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador do tributo ou a natureza dos elementos constitutivos da obrigação tributária, observados os procedimentos a serem estabelecidos em lei ordinária.”

Na esfera administrativa, a diferenciação entre o que é normalmente considerado lícito e aceitável em termos de “economia fiscal” é a chamada “motivação” ou “propósito negocial”. Nesta linha, para uma parte dos entendimentos proferidos, é levado em consideração a demonstração de que determinada “operação” foi realizada visando atender a, por exemplo, uma necessidade operacional da empresa, e não apenas o afastamento ou redução do tributo.

Sobre o conceito de “simulação”, algumas recentes decisões do CARF que seguem o entendimento mais restritivo, baseiam-se não somente no CTN, mas também no atual artigo 167 do Código Civil, que trata da simulação em negócios jurídicos, para desconstituir atos e negócios praticados pelos contribuintes.

Neste aspecto, recentemente, o Supremo Tribunal Federal, ao finalizar o julgamento da ADIn 2446, entendeu ser constitucional tal parágrafo único do artigo 116 do CTN. Em que pese ter-se decidido não haver inconstitucionalidade, a maioria da doutrina relacionada entende que tal decisão foi favorável aos contribuintes, na medida em que no voto condutor do julgamento, a relatora, ministra Cármen Lúcia, acompanhada pela maioria (nove ministros) observou que “a desconsideração autorizada pelo dispositivo está limitada aos atos ou negócios jurídicos praticados com a intenção de dissimulação ou ocultação de fato gerador que, além de estar previsto em lei, já tenha se materializado. Neste particular, para a relatora, “a norma não proíbe o contribuinte de buscar economia fiscal pelas vias legítimas, realizando suas atividades de forma menos onerosa, e, assim, deixar de pagar tributos quando não for configurado fato gerador cuja ocorrência tenha sido licitamente evitada. A ministra explicou, ainda, que a denominação “norma antielisão”, como a regra é conhecida, é inapropriada, pois o dispositivo trata de combate à evasão fiscal, instituto diverso: “Na elisão fiscal, há diminuição lícita dos valores tributários devidos, pois o contribuinte evita a relação jurídica geradora da obrigação tributária, enquanto, na evasão fiscal, o contribuinte atua de forma a ocultar fato gerador para omitir-se ao pagamento da obrigação tributária devida.”. A interpretação dominante por parte dos contribuintes, portanto, é de que o STF teria com tal decisão permitido o planejamento tributário para que se evite a ocorrência do fato gerador, ainda que apenas com o objetivo de economia fiscal, sem a necessária existência de propósito negocial.

A PGFN, por sua vez, se manifestou em sentido não conclusivo, pois entende que por ter a norma “anti-elisiva” sido considerada constitucional, a possibilidade de aplicação seria irrestrita, além de ressaltar que “O voto não trouxe nada novo porque a Receita já não se pautava mais pelo artigo 116, parágrafo único, para lavrar os autos de infração, mas sim pelo artigo 149, inciso VII, do CTN, e por outros dispositivos.”. Segundo o artigo 149, inciso VII, o lançamento tributário é efetuado e revisto pela autoridade administrativa “quando se comprove que o sujeito passivo, ou terceiro em benefício daquele, agiu com dolo, fraude ou simulação”, de modo que não teriam sido definidos “os limites necessários nem para que os contribuintes possam fazer planejamento tributário com mais segurança nem para que a Receita tenha as limitações das suas atuações mais claras.”

Não obstante esta atual indefinição jurisprudencial e de interpretação, encontra-se em trâmite no Congresso um Projeto de Lei Complementar (125/2022), que estabelece normas gerais relativas a direitos, garantias e deveres dos contribuintes, e, dentre outras disposições, traz normas com o intuito de desestimular a prática de atos e negócios jurídicos tidos por contrários à lei, realizados através de planejamentos tributários.

Diante do exposto, o que se pode concluir é que não há atualmente vedação legal para a implantação do chamado planejamento tributário. Todavia, a jurisprudência, tanto administrativa quanto judicial, encontra-se atualmente controvertida, havendo diversos julgados mais restritivos, que interpretam a questão a partir do entendimento do Fisco, no sentido de não haver propósito negocial ou ainda que haveria uma espécie de simulação. Há, por outro lado, também julgados favoráveis e menos restritivos, que interpretam o planejamento tributário, desde que possuindo correspondência da substância das operações com as formas que foram adotadas para a sua realização, como perfeitamente lícito e não configurador de simulação ou evasão, sendo indevida a ingerência da administração tributária na liberdade de iniciativa de que dispõe o contribuinte, de reestruturar a exploração do seu capital da forma mais eficiente, inclusive sob a perspectiva fiscal.

Curitiba, junho de 2024.

DRESCH FILHO & ADVOGADOS ASSOCIADOS

Alessandro Vinicius Pilatti – OAB/PR 30.015


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