Nos últimos anos, o avanço de legislações e tratados de compliance anticorrupção, impulsionados pela Lei Anticorrupção brasileira (Lei nº 12.846/2013), pela OCDE e por regimes como o UK Bribery Act e o FCPA norte-americano, elevou o padrão global de integridade.
Empresas com operações internacionais ou inseridas em cadeias globais de fornecimento vivem um momento de redefinição: integridade, transparência e governança deixaram de ser diferencial reputacional e se tornaram requisito para competir, captar recursos e atrair investidores ESG.
A nova geração de regulações anticorrupção exige que empresas demonstrem não apenas políticas escritas, mas comportamentos verificáveis, controles eficazes e provas contínuas de integridade e diligência, em todas as jurisdições onde atuam.
O novo contexto global: do compliance legalista ao compliance estratégico
O cenário de 2024 em diante mostra um claro deslocamento: compliance não é mais defesa, é estratégia.
A intensificação da cooperação internacional entre autoridades regulatórias, o rastreamento digital de transações e a pressão de investidores por dados ESG auditáveis ampliaram o escopo do compliance corporativo.
Empresas globais agora são cobradas em três frentes:
- Integridade nas operações transnacionais, incluindo agentes intermediários e parceiros comerciais;
- Transparência na cadeia operacional, especialmente em setores regulados e de alto risco (energia, construção, saúde, tecnologia);
- Governança de dados, que se conecta diretamente à agenda anticorrupção pela rastreabilidade e accountability.
No Brasil, a Lei Anticorrupção consolidou a responsabilidade objetiva da pessoa jurídica por atos contra a administração pública, seja no âmbito nacional ou estrangeiro, alinhando o país a padrões da OCDE e da ONU.
O efeito prático é claro: multas milionárias, restrições a crédito e exclusão de contratos públicos tornaram o compliance um ativo de sobrevivência.
Riscos e vulnerabilidades em operações internacionais
A expansão internacional multiplica riscos e pontos de exposição. O problema raramente está na controladora, e sim nos terceiros, distribuidores, agentes locais e joint ventures.
Pagamentos de facilitação, doações, consultorias ou reembolsos sem lastro documental são gatilhos clássicos para infrações transnacionais.
Entre os principais vetores de risco estão:
- Terceiros e intermediários sem due diligence robusta;
- Integração pós-M&A falha, sem revisão prévia de passivos ocultos;
- Registros contábeis incompletos e ausência de segregação de funções;
- Canais de denúncia inefetivos ou sem proteção a denunciantes;
- Governança de dados, cuja má utilização pode gerar riscos de manipulação ou fraude.
Esses fatores impactam acesso a capital, valuation e Seguro de Responsabilidade Civil de Administradores, pois investidores e auditores internacionais já exigem comprovações de due diligence contínua e relatórios ESG integrados.
De “programa no papel” a compliance efetivo
Um programa de integridade global eficaz é aquele que transforma valores em práticas verificáveis.
Conforme reforçado por diretrizes internacionais da OCDE e do Banco Mundial, a eficácia depende de três elementos: liderança, continuidade e evidência documental.
Os pilares essenciais incluem:
- Tone at the top: exemplo visível da alta direção, incluindo o board e a auditoria.
- Risk assessment contínuo: atualização periódica dos mapas de risco conforme novas jurisdições e parceiros.
- Due diligence de terceiros: avaliação prévia, monitoramento contínuo e cláusulas de rescisão ética.
- Treinamentos baseados em risco, priorizando áreas e cargos sensíveis.
- Speak-up e investigações independentes, com trilhas de auditoria e imparcialidade.
Mais do que isso, a integração com ESG e relatórios de sustentabilidade tornou-se mandatória. A governança de compliance agora precisa gerar métricas e KPIs, capazes de demonstrar valor tangível e reduzir custos de transação.
Empresas que internalizam a ética como componente econômico passam a competir em eficiência, não apenas em conformidade.
Compliance como vantagem competitiva
O avanço das normas anticorrupção e o alinhamento das práticas empresariais aos princípios ESG criaram uma nova fronteira de valor.
Empresas que tratam compliance como ativo estratégico, e não como custo, fortalecem sua reputação, ampliam o acesso a capital e consolidam a confiança de stakeholders globais.
A governança ética e a transparência documental deixaram de ser apenas obrigações legais: são hoje fatores de performance e longevidade corporativa.